A inadimplência relacionada a empréstimos imobiliários nos Estados Unidos atingiu no último trimestre de 2006 seu mais alto nível em mais de três anos, informou na terça-feira (13) a Associação dos Banqueiros Hipotecários (MBA).
O anúncio da MBA provocou uma forte queda nas bolsas norte-americanas, que refletiu-se também no mercado brasileiro.
No total, 4,95% dos empréstimos imobiliários não foram pagos no quarto trimestre de 2006, o que representa um aumento de 0,28 ponto percentual em relação ao trimestre precedente. “Trata-se do nível mais elevado desde 2003’’, destacou Gina Martin, do grupo financeiro Wachovia.
A maior parte da inadimplência se refere aos empréstimos “subprime” (concedidos ao segmento baixa renda), com índice de 13,33%, contra 12,56% no trimestre precedente. Para os empréstimos subprime de taxas variáveis, o não pagamento ficou em 14,44%, contra 13,22%.
Maria, uma mexicana de 39 anos que mora em Kansas City, no Missouri, com o marido e três filhos, sonhava com uma casa e cozinha maiores.
Quando recebeu uma oferta de financiamento para trocar a sua casa de dois quartos, avaliada em 20.000 dólares, por outra de quatro quartos e a cozinha de seus sonhos por 114.000 dólares, ela nem pestanejou.
Disse que podia pagar prestações fixas e, junto com seu marido Francisco, 40, assinou os papéis. Dois anos depois, a prestação começou a subir e foi só aí que o casal começou a entender que tinha se metido numa enrascada.
Maria caiu no canto da sereia dos corretores de imóveis dedicados ao chamado mercado subprime - que financia pessoas com pouco ou nenhum histórico de crédito, em troca de juros que começam a subir só depois de um tempo.
Com o desaquecimento do setor imobiliário norte-americano, esse tipo de financiamento, que corresponde a 13,6 % do mercado imobiliário, segundo a Associação de Bancos de Financiamento Imobi-liário, foi o primeiro a entrar em colapso.
Maria e Francisco, ambos imigrantes ilegais, disseram que não sabiam que os juros íam começar a subir. Em pouco mais de dois anos, estavam sem condições de pagar os $1,6 mil da nova prestação, incluindo impostos e seguros, sem compradores para a casa e perderam a propriedade.
“Se eu soubesse do que se tratava, nunca teria assinado esses papéis”, disse Maria, agora morando num apartamento alugado de $659 com o marido e os três filhos.
Os juros
Os problemas começaram no ano passado, quando o presidente do Fed (o banco central dos Estados Unidos), Ben Bernanke, deu a entender que estava surgindo um movimento inflacionário no país, por conta do excesso de dinheiro no mercado. Como forma de controle, as taxas de juros entraram em um movimento de leve alta.
“Com a alta dos juros, as pessoas, ao invés de comprar imóveis, começaram a se sentir mais atraídas a aplicar em títulos do governo”, explica Almeida. O mercado imobiliário, então, começou um movimento reverso, de queda nos preços, provocada pela menor procura.
Entenda a bolha imobiliária
A desaceleração da economia dos EUA está provocando a desconfiança dos investidores.
O abalo econômico tem origem no mercado imobiliário: os americanos estão atrasando ou deixando de pagar a hipoteca da casa própria. Com isso, são afetadas todas as empresas envolvidas nos empréstimos imobiliários. E o calote não é pequeno. Segundo o professor de economia Ricardo Almeida, do Ibmec São Paulo, grande parte do total de empréstimos feitos nos EUA são hipotecas.
Hipoteca
Nas últimas décadas, a classe média norte-americana hipotecou em massa seus imóveis. Como funciona: empresas especializadas dão empréstimos e tomam as casas como garantia. Essas empresas, por sua vez, funcionam como ‘intermediárias’. Elas buscam junto a investidores o dinheiro para oferecer nos empréstimos.
Com o aumento desse mercado, o investimento em imóveis tornou-se bastante atrativo. Aumentando a demanda, o preço dos imóveis subiu.
Inadimplência
Com os preços dos imóveis em baixa, as novas hipotecas alcançaram valores menores – e as empresas de concessão de crédito passaram a enfrentar a inadimplência. No total, 4,95% dos empréstimos imobiliários não foram pagos no quarto trimestre de 2006.
Os latinos, que são 14% da população, estão sendo particularmente afetados, já que tendem a usar esse tipo de financiamento para comprar a primeira casa, pela falta de histórico de crédito.