A paulista Janaína Nascimento, 41 anos, foi do sonho de ter uma vida boa em Miami ao pesadelo de estar numa prisão americana. Desembarcou sozinha em Miami em 2002, aos 19 anos, tornou-se uma bem-sucedida empresária. Mas, em 2019, foi acusada de vender produtos falsos e acabou presa. Ao sair, ainda descobriu que seu marido a traía.
Agora, ela conta sua história de aprendizado, resiliência e superação no livro "Liberdade perseguida: do sonho americano a alguns meses em uma prisão federal", lançado em abril de forma impressa e online.
Condenada a seis meses de prisão e a um ano de liberdade assistida, Nascimento foi cumprir sua pena no Marianna Federal Prison Camp Florida, um campo prisional de segurança mínima feminina no condado de Jackson, norte da Flórida.
Em entrevista exclusiva ao Gazeta News, Ninna Nasci, como se apresenta no Instagram, contou detalhes sobre o tempo que passou na prisão, a rotina diária de uma detenta, a dificuldade em um sistema criminal complexo e em outro país e a volta por cima depois de perder quase tudo.
GN - Como era a sua rotina diária dentro da prisão?
JN - Onde fiquei era um campo de trabalho. O dia começava bem cedo, o café da manhã era servido às 6:00, então os alto-falantes começavam suas atividades por volta da 5:30h. O meu trabalho era limpar o banheiro e tinha das 7h às 9h para fazê-lo, depois eu tinha o dia livre. Eu aproveitava para ler livros, a Bíblia, fazer exercícios, me apaixonei pelo pickleball (esporte de raquete) e jogávamos cartas. Eu evitava ao máximo ficar dentro dos dormitórios, pois o barulho era muito intenso. O almoço era sempre servido as 10:30h da manhã e o jantar às 4h da tarde.
GN - Qual o momento mais marcante enquanto estava detida?
JN - É difícil selecionar somente um momento, existiram alguns bons e outros ruins. Mas vou citar um que me fez muito feliz, foi quando consegui comprar roupas de frio. Eu já estava lá há dias e o ar-condicionado ficava numa temperatura muito baixa, era de doer os ossos. Nunca me senti tão feliz de comprar roupas na minha vida e sequer imaginei que a minha felicidade seria tão grande comprando coisas tão simples. Estar aquecida e conseguir ter uma noite de sono sem sentir que fosse congelar foi algo muito marcante.
GN- Teve algum momento que você perdeu as esperanças?
JN - Quando eu entrei no campo, a sensação que predominava era que tudo estava acabando, que eu estava a um passo de reconstruir a minha vida depois de ter vivido aquele pesadelo por anos (foram 4 anos de processos legais). Pelo telefone fazia planos com meu parceiro de mudar de país, de recomeçar em outro lugar, visando uma vida com mais tranquilidade e existiam muitos planos. Mas quando voltei para a casa, em menos de 10 minutos descobri que havia sido traída e, aí sim, meu mundo desabou. Tudo que eu tinha usado para ficar de pé e construir meu alicerce para recomeçar não existia mais. Eu tinha sido muito forte e voltar para a casa era sinônimo de agora "ter colo", ser cuidada, mas a realidade foi totalmente diferente e eu não tinha estrutura psicológica para aguentar mais aquilo. Foi então que eu quase desisti de mim.
GN - Quem a denunciou oficialmente?
JN - Eu tinha uma licença do FDA (Food and Drug Administration), os produtos passaram por eles, pelo CBP (U.S. Customs and Border Protection) e foi entregue na minha empresa. Mesmo assim, quando eu recebi a carta que me indiciava, dizia que foi feito pelo mesmo FDA, como se eu tivesse tido intenção de burlar o sistema e introduzir produtos falsos no mercado americano.
GN - Você pensou em ir atrás de quem lhe vendeu o produto falsificado?
JN - Foi feito um Cross Claim (reivindicação afirmada entre co-réus), mas obviamente era impossível sustentar uma ação em outro país. No decorrer do processo descobrimos que a fábrica que estava falsificando e distribuindo, já havia sido fechada em 2011 pelo mesmo motivo. Até hoje não sei o que houve com todos os envolvidos, pois o processo aconteceu em sigilo.
Em 22 de novembro de 2022, o tempo de prisão domiciliar acabou. Com todas as obrigações cumpridas perante a justiça americana, ela voltou para Bragança Paulista, sua cidade natal, para o colo da mãe e para a retomada de sua vida.
Cidadã americana, voltou também a trabalhar com sua empresa comercializando produtos hospitalares nos EUA, porém, diferentes, para não correr o risco de passar pelos mesmos problemas.