“A aldeia toda se incendeia / Na manhã de sol na floresta. / Tem peixe assando na fogueira / E suco de cupu para completar a festa.” Os versos escritos por Tiago Hakiy (foto de destaque), poeta e escritor indígena, permitem que o leitor entre no coração da floresta amazônica e se sinta parte dela. Durante alguns instantes, somos parte da festa, dançamos, provamos peixes e sucos típicos da região. O trecho acima faz parte do livro Abecedário Poético da Floresta, lançado em novembro. A obra tanto apresenta os segredos da cultura para os leigos como acolhe os espíritos locais.
“Na escola, eu sempre encontrei livros que não tinham nada a ver com a minha realidade. Eles falavam sobre tubarão e eu nunca vi tubarão. Falavam de frutas, como maçã e morango, que eu nunca tinha comido. Sobre peixes que não eram parte da nossa fauna amazônica. Eu se me sentia perdido nessa literatura. Quando escrevo hoje, penso nos meninos e nas meninas nascidos no meio dos rios e florestas, que andam de canoa. Para que eles possam se identificar com a própria realidade”, diz o poeta.
Nem sempre os escritos de Tiago Hakiy seguiram esse caminho. Pertencente ao povo sateré-mawé, ele nasceu na comunidade Freguesia do Andirá, no município de Barreirinha, no Amazonas, longe de espaços editoriais e grandes centros urbanos. Aos 6 anos de idade, um escritor foi até a comunidade e o ajudou a conhecer o universo dos livros. Aos 19 anos, se mudou para Manaus, onde entrou na universidade e teve a possibilidade de lançar o primeiro livro de poesias.
Os versos iniciais não falavam da realidade cultural dele e do povo indígena. Eram poemas mais idílicos. Tudo mudou quando ele encontrou o escritor Daniel Munduruku, um precursor da literatura indígena no Brasil.