A Defensoria Pública da União (DPU), junto com a organização não governamental Memorial das Ligas e Lutas Camponesas (MLLC) da Paraíba, solicitou ao governo federal a anistia coletiva para as Ligas Camponesas do estado. O objetivo é reconhecer e reparar as graves violações de direitos humanos sofridas pelos trabalhadores rurais durante a ditadura militar no país.
Segundo a DPU, as Ligas Camponesas, formadas por trabalhadores rurais que lutavam por reforma agrária e melhores condições de vida, foram alvo de perseguições, torturas, desaparecimentos forçados e assassinatos. O documento cita casos como os de João Pedro Teixeira, Pedro Fazendeiro e Nego Fuba, demonstrando a brutalidade da repressão do Estado e de milícias privadas. De acordo com o órgão, a repressão “não foi apenas uma série de ações isoladas, mas parte de uma política sistemática de controle social e eliminação de opositores ao regime”.
Esta é a primeira vez que um pedido de anistia coletiva da DPU é direcionado à questão da reforma agrária, conforme apontou o defensor público federal Bruno Arruda, coordenador executivo do Observatório Nacional de Memória, Verdade e Justiça de Transição do órgão, em entrevista à
Agência Brasil. “Esse pedido tem uma relevância particular porque ele reconhece que o Estado atuou com violência contra essas pessoas que estavam lutando por reforma agrária.”
“Tinha coletivos organizados naquele período que estavam lutando por reforma agrária e direitos trabalhistas no campo. E eles eram duramente repreendidos tanto pela polícia quanto por milícias particulares, com conivência da polícia. Isso já acontecia antes, e, quando veio o golpe militar, piorou”, relatou o defensor. O pedido de anistia coletiva se refere a violações cometidas especificamente no período de 1958 a 1981.
Protocolado no Ministério de Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) em 17 de maio, o requerimento será objeto de análise pela Comissão de Anistia a fim de subsidiar a decisão do ministro. O pedido está embasado em relatório de provas, com base em documentos do Serviço Nacional de Informações (SNI), fichas do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e relatos da Comissão Nacional da Verdade, que detalham essa repressão violenta.
Presidenta do Memorial das Ligas e Lutas Camponesas (MLLC), Alane Lima aponta que o que os camponeses mais esperam do governo federal é que seja feita a reforma agrária, além do reconhecimento de participação do Estado na perseguição da classe.
“A reparação agrária é necessária. A gente deseja demais que essa anistia coletiva venha acompanhada de uma demarcação de terra para aqueles e para aquelas que têm seus direitos básicos violados, que é o direito à terra”, disse a camponesa.
Após quase 40 anos do fim da ditadura militar no país, Alane ressalta que as violações de direitos de camponesas ainda permanecem. “A maior violação de direitos humanos é camponês sem terra, é aquele que produz não ter um pedaço de terra para produzir e garantir a alimentação base da sua família.” Ela lamenta a falta de acesso a direitos básicos. “A gente está localizado numa comunidade tradicional em que há diversas famílias que ainda vivem em casa de taipa e vivem em condições de moradia desumanas”, acrescenta.
Entre as medidas de reparação solicitadas pela DPU, estão o reconhecimento público das violações cometidas, a implementação de políticas específicas de reforma agrária, a demarcação e desapropriação de terras para fins de reforma agrária e a recuperação de arquivos históricos que documentam as atrocidades cometidas contra os camponeses.
“Um dos elementos mais importantes da anistia coletiva é o pedido de desculpas, o Estado brasileiro reconhecer que perseguiu aquelas pessoas ilegitimamente, porque a luta delas era legítima. Na sequência, vem, por exemplo, que seja implementada uma política de reforma eficiente e pedir celeridade nos processos de anistia individual das pessoas do campo”, explicou o defensor público federal Bruno Arruda.