Seis assentamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) sofreram os impactos das fortes chuvas que atingiram o Rio Grande do Sul, desde o final de abril. Entre os assentados, são 290 famílias desabrigadas, das quais 38 famílias conseguiram retornar para os próprios lotes, a fim de reconstruir as áreas devastadas. As demais estão em abrigos ou realocadas provisoriamente em outros assentamentos.
Ao todo, 420 famílias assentadas foram afetadas por algum transtorno relacionado a alagamentos, inundações de casas, perda da produção de alimentos, prejuízos de estruturas, ferramentas, maquinários, além da vida de animais. Levantamento preliminar divulgado hoje (17) pelo MST apontou prejuízo de R$ 90 milhões, considerando produção nas hortas, cultura leiteira e do arroz.
Os assentamentos atingidos estão localizados na região metropolitana de Porto Alegre e região central do estado: Integração Gaúcha (IRGA) e Colônia Nonoaiense (IPZ), em Eldorado do Sul; Santa Rita de Cássia e Sino, em Nova Santa Rita; 19 de Setembro, em Guaíba e Tempo Novo, em Taquari.
Recorrência
O MST avalia que, para a reconstrução, é preciso uma mudança drástica no modelo de sociedade, de manejo ao meio ambiente e de produção agrícola. “Essas catástrofes acontecem como uma resposta da natureza, a natureza cansou. Isso é resultado da ação humana. O sistema capitalista em que nós vivemos em nosso país, em que o lucro está acima de tudo, ele vem gradativamente destruindo tudo”, disse, em nota, Salete Carollo, da direção estadual do movimento no estado gaúcho.
Há famílias, segundo o levantamento, que não querem retornar para suas terras por conta da recorrência das enchentes na região. “É a terceira enchente seguida e o efeito acumulado sobre a produção é de devastação praticamente total”, relatou a agricultora de arroz orgânico Dionéia Soares Ribeiro, em comunicado divulgado pelo MST.
Dionéia, que é coordenadora de insumos do MST no Rio Grande do Sul e diretora da Cooperativa dos Trabalhadores Assentados da Região de Porto Alegre (Cootap), avalia que a produção de arroz agroecológico está em risco, diante da possibilidade de chuvas cada vez mais severas.
Após o atendimento emergencial aos atingidos, como alimentação e abrigo, o MST aponta a necessidade de iniciativas do governo para que as famílias possam ser reassentadas em áreas em que não haja risco de inundação.
Arroz
A rizicultura do MST ocupa uma área total de 2,8 mil hectares no estado, sendo que a maior parte está justamente nas áreas inundadas. Do arroz agroecológico que havia sido plantado neste ano, 755 hectares foram perdidos. Já a produção de arroz em transição agroecológica teve perda de 838 hectares, e a produção de arroz convencional registrou perda de 765 hectares.
Na soma, as três categorias produtivas de arroz tiveram perda correspondente a uma área de 2.358 hectares, nas áreas de seis assentamentos da reforma agrária afetados pelas chuvas da região. O investimento de produção, contratos, insumos e prejuízos na comercialização somam mais de R$ 52 milhões só do arroz, segundo o MST.
Hortaliças e pecuária
O levantamento preliminar do movimento revelou ainda que, apenas na região metropolitana do Rio Grande do Sul, 200 famílias envolvidas na produção de hortaliças e frutas foram atingidas, o que representa cerca de 300 hectares plantados. “Dessas famílias, 170 perderam toda sua produção de hortaliças, raízes e frutas de uma área de 250 hectares. Isso representa em valores o montante estimado em R$35 milhões, considerando os 12 produtos principais dessa produção local”, divulgou o MST.
A estimativa é que, na produção de hortas, as folhosas só voltarão a produzir de 45 a 60 dias após a retomada da produção. Os demais cultivos - beterraba, cenoura, aipim, batata doce, morangas, abóboras - apenas na primavera, com colheita prevista para 2025. Segundo o MST, famílias afetadas integravam o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) na modalidade de Doação Simultânea, com contratos em torno de R$2 milhões, que precisarão ser prorrogados para o próximo ano por causa das perdas na produção.
Na pecuária leiteira, o levantamento feito pelas famílias associadas da Cooperativa dos Trabalhadores Assentados da Região de Porto Alegre (Cootap) estimou perdas de quase R$ 3 milhões, considerando os prejuízos entre galpões, pastagens plantadas, animais, maquinários e leite não entregue. Somente em Eldorado do Sul, a perda chegou a R$ 1,29 milhão. As mortes de animais chegaram a 95 cabeças de gado, sendo 55 mortes em Eldorado do Sul.
Situação no estado
O número de mortes em consequência dos temporais que atingiram o estado desde o fim de abril subiu para 154, conforme boletim divulgado pela Defesa Civil nesta sexta-feira. Em todo o estado, 98 pessoas continuam desaparecidas e há 806 feridos.
O número de pessoas fora das próprias residências devido às cheias dos rios já ultrapassou 618,3 mil, sendo 540.192 desalojados, que são aqueles que tiveram de sair de seus lares e estão acolhidos em casas de parentes e amigos. O restante, de acordo com o monitoramento atualizado diariamente pela Secretaria de Desenvolvimento Social (78.165 pessoas), vive temporariamente em um dos mais de 875 abrigos cadastrados no estado.
O número de atingidos também aumentou para 2.281.830 de pessoas, ou 20,95% dos 10,88 milhões de habitantes do estado. As chuvas afetaram nove em cada dez municípios gaúchos. De acordo com o último boletim, 92,75% (461) dos 497 municípios do Rio Grande do Sul tiveram suas rotinas impactadas pelos eventos climáticos.