A Polícia Federal entregou ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), um relatório no qual aponta a existência de uma milícia digital que tem como objetivo o ataque às instituições e à democracia. Segundo as investigações, o grupo teria usado a estrutura do “gabinete do ódio” para promover os ataques.
“Identifica-se a atuação de uma estrutura que opera especialmente por meio de um autodenominado ‘gabinete do ódio’: um grupo que produz conteúdos e/ou promove postagens em redes sociais atacando pessoas (alvos) — os ‘espantalhos’ escolhidos — previamente eleitas pelos integrantes da organização, difundindo-as por múltiplos canais de comunicação”, detalhou no documento a delegada responsável pelos inquéritos de fake news e milícias digitais, Denisse Ribeiro.
Segundo a delegada, o grupo atua em quatro fases. Na primeira, chamada de eleição, são escolhidos os alvos. Em seguida, na preparação, as tarefas dos membros e os canais em que as mensagens serão difundidas são definidos. Já na terceira fase vem os ataques “nas diversas postagens com conteúdo ofensivo, inverídico e/ou deturpado, formulado por várias fontes, por diversos canais e intensificado pela transmissão/retransmissão a integrantes do grupo que possuem muitos seguidores/apoiadores nas redes sociais, potencializando a difusão da notícia”.
No mesmo documento, Denisse Ribeiro aponta que há ainda a reverberação, ou seja, a “multiplicação cruzada das postagens por novas retransmissões, complementadas ou não com novos elementos agregados, inclusive realizada por autoridades públicas e/ou pelos meios de comunicação tradicionais”. A estratégia do grupo, segundo a Polícia Federal, tem sido explorar os limites entre crimes contra a honra e a liberdade de expressão.
O objetivo, diz a delegada, é criar uma falsa ideia de que a Constituição permite a publicação de qualquer conteúdo sem que o autor seja responsabilizado. “Sob essa ótica, tem sido rotineiro questionar os limites entre a prática dos chamados delitos de opinião (especialmente calúnia e difamação) e a amplitude da liberdade de expressão, gerando uma ideia de que a Constituição Federal criou uma zona franca para a produção e divulgação de qualquer conteúdo sem risco de responsabilização. Não é o que ocorre com qualquer Estado Democrático de Direito.”
A delegada Denisse Ribeiro também avalia, no relatório enviado ao Supremo, que as investigações devem ter continuidade diante dos vários elementos reunidos que indicam possíveis crimes. Para ela novas diligências precisam ser realizadas, além da tomada de depoimentos, cruzamentos de dados e outras medidas.
Histórico
O inquérito que investiga a suposta atuação de uma milícia digital foi aberto no ano passado por determinação do ministro Alexandre de Moraes. A nova apuração foi iniciada depois que o procurador-geral da República, Augusto Aras, solicitou o arquivamento de outra investigação a respeito do presidente Jair Bolsonaro e aliados.
No relatório, a PF também sustenta que a organização criminosa digital foi usada para disseminar notícias falsas sobre o chamado “tratamento precoce” contra a covid-19, feito a partir de medicamentos considerados ineficazes para esse fim pela comunidade científica.