Pesquisa desfaz o mito do brasileiro 'extrovertido'
A idéia de que os brasileiros são extrovertidos, os argentinos são neuróticos, os alemães são responsáveis e os tchecos são brigões pode não passar de mito, de acordo com uma pesquisa realizada em 49 países diferentes e divulgada nesta sexta-feira pela revista Science.
Comparando os resultados de estudos sobre a percepção das pessoas sobre o caráter nacional por meio de auto-avaliações, os pesquisadores chegaram à conclusão de que a maioria dos estereótipos ligados às nacionalidades são falsos.
“Nossa principal descoberta é que as pessoas têm conceitos sobre as outras pessoas que não estão baseadas na realidade”, disse à BBC Brasil Robert McCrae, coordenador do estudo. A pesquisa foi encomendada pelo National Institute of Aging, ligado ao governo americano.
No caso do Brasil, a maioria da população considera seus conterrâneos como extrovertidos, abertos e cordiais, mas quando as pessoas se auto-avaliam ou avaliam pessoas próximas, nenhuma dessas características se sobressai em relação à média internacional.
“Não se observaram diferenças significativas entre o Brasil e outros países ocidentais em qualquer dos dados de auto-avaliação”, afirma Carmen Flores-Mendoza, professora da Universidade Federal de Minas Gerais e responsável pela pesquisa no Brasil.
“Isto significa que os brasileiros não apresentaram extroversão, cordialidade, abertura à experiências, neuroticismo e responsabilidade mais elevado ou mais diminuído do que populações de outros países”, diz.
Discordância
O índice no Brasil de concordância entre os estereótipos e as características obtidas na auto-avaliação foi o menor entre os 49 países analisados.
Outros países com baixo índice de concordância entre as duas avaliações incluem a Argentina e o Japão, onde a principal característica nacional foi a neurose, o Canadá, cujos habitantes se vêem como cordiais, a China, cujo estereótipo é de cordialidade e responsabilidade, Portugal, com o estereótipo de cordialidade, e a Itália, onde as pessoas vêem a abertura às experiências como principal característica nacional.
No outro extremo, os maiores índices de concordância entre estereótipos e auto-avaliação ocorrem entre britânicos, belgas e dinamarqueses, que se vêem como responsáveis, os australianos e libaneses, que se consideram extrovertidos, e os poloneses, auto-avaliados como neuróticos.
Segundo Carmen Flores-Mendoza, o caso do Chile, que teve a segunda menor média de avaliação dos conterrâneos em relação a responsabilidade, atrás somente da Indonésia, mostra como essas percepções estão longe da realidade.
“Se a percepção estivesse correta e os chilenos, de fato, fossem pouco responsáveis, o Chile não apresentaria a pujança socioeconômica que atualmente apresenta”, afirma.
A pesquisa ouviu 3.989 pessoas nos 49 países avaliados. No Brasil, 611 pessoas responderam ao questionário de auto-avaliação e de avaliação de pessoas próximas, em relação às cinco grandes características principais: extroversão, neurose, cordialidade, abertura a experiências e responsabilidade.
Outras 149 pessoas participaram da avaliação da percepção do caráter nacional. A pesquisa brasileira foi feita em Belo Horizonte, São Paulo e no Estado de Santa Catarina.
Para Robert McCrae, os resultados da pesquisa devem ser recebidos com preocupação. “As percepções das pessoas sobre os outros são baseadas em generalizações e não levam em consideração as particularidades de cada indivíduo”, afirma.
Segundo ele, as generalizações que formam os estereótipos são a base do preconceito. “As pessoas pensam nos estereótipos nacionais como piada, mas eles têm seu lado perigoso também.”