Editorial: A união que vem após tragédias

Por Arlaine Castro

A vida é fugaz e não é feita só de momentos felizes. Na tragédia, temos a oportunidade de revelar sentimentos escondidos no cotidiano e que esquecemos que existem.

Depois do choque e da tristeza, vem à tona a solidariedade, a comoção, a empatia, a amizade, o companheirismo e o amor – sentimentos que confortam.

Atualmente, vemos com frequência atitudes egoístas, incapacidade de união entre familiares, colegas de profissão e das pessoas em geral. É um tentando levar vantagem em cima do outro, infelizmente. As demonstrações de solidariedade vêm com maior carga após grandes tragédias. E é aí que entra o lado social e comunitário.

Os desastres devem ser enfrentados sob uma perspectiva social porque são construídos socialmente, diz o sociólogo e demógrafo Roberto do Carmo, professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp e pesquisador do Núcleo de Estudos de População (Nepo).

No livro que lançou em março deste ano, “Segurança humana no contexto dos desastres”, pela editora Rima (organizado em conjunto com a pesquisadora Norma Valencio), Carmo fala de enfrentamentos em situações de desastre. Apesar de abordar o desastre ambiental em Mariana (MG), que completou um ano em novembro, as opiniões do professor cabem perfeitamente para a tragédia dessa semana com a equipe de futubel Chapecoense.

Há um certo padrão de comportamentos em casos de tragédias como essa. Em um primeiro momento, logo após o acidente, acontece a comoção, e as manifestações exaltadas de agentes sociais para ajudar. É o momento do clamor por ações incisivas, de proposição de ações punitivas de grande intensidade, com grande impacto midiático.

O segundo momento é o de avaliação da real extensão dos problemas e de suas decorrências. Em geral, percebe-se nesse momento que o desastre tem implicações muito mais complexas do que o inicialmente avaliado. É o momento em que se identificam as eventuais responsabilidades legais, e se iniciam os procedimentos legais.

O terceiro momento é o da “acomodação”. Os procedimentos legais foram instaurados, e se iniciam os trâmites que podem levar anos até serem concluídos. As vítimas do desastre resolvem a sua situação básica (em termos físicos e emocionais) da melhor maneira que podem, muitas vezes, com pouca ajuda. A opinião pública se desmobiliza aos poucos.

O quarto momento é o do “esquecimento”. O desastre perde espaço no noticiário, por conta de outros desastres que eventualmente ocorrem. A opinião pública se desmobiliza. Apenas os afetados continuam atentos aos desdobramentos das ações judiciais. A responsabilização e as reparações dificilmente são suficientes ou adequadas, tendo em vista a extensão das perdas. Em geral, não são feitas avaliações sobre como evitar situações semelhantes.

Luto compartilhado Após o acidente aéreo, o Brasil e o mundo (por que, não?) estão de luto. A cidade de Chapecó é só angústia. Decretou 30 dias de luto. Lendo a repercussão do acidente na internet, entre milhares de depoimentos, um chama a atenção. Um morador da cidade relata que, após a notícia da tragédia, só se ouvia o barulho do vento e mais nada pelas ruas da cidade.

Nesses momentos, milhares de mensagens emocionadas se propagam às famílias das vítimas, inclusive de pessoas que nem falam a mesma língua, mas sentem a mesma tristeza. A humanidade, em seus momentos mais tristes, mostra que ainda é possível ser HUMANO.