Hendrik Zanotti Franco é um jovem paulista de 25 anos, atleta, de bem com a vida e um exemplo de determinação. Nada surpreendente, até ele revelar que ficou tetraplégico há seis anos, após fraturar a coluna cervical em uma brincadeira.
Cheio de esperança desde o início de seu tratamento, o jovem, agora, prepara-se para vir a Miami para participar de um projeto mantido pela University of Miami - Miller School of Medicine, chamado The Miami Project Cure Paralysis, que consiste em transplante celular.
O brasileiro tomou conhecimento sobre o projeto, se inscreveu e foi aceito. Neste momento, ele luta para conseguir ajuda financeira para se manter no sul da Flórida enquanto estiver fazendo o tratamento, ainda sem previsão de duração. “Estou buscando um lugar para morar, que seja acessível financeiramente, mas estando aqui no Brasil fica difícil. Também estou fazendo uma campanha, para que eu possa me manter no período do tratamento, mas ainda não é suficiente”, conta.
Para falar dessa jornada que está só começando, o jovem criou um blog (hendrikmiamiproject.blogspot.com.br), mesmo com dificuldades para escrever. “Quero levar muitas informações úteis a quem deseja aprender sobre as mais recentes descobertas da medicina no campo da mobilidade humana e também para outras pessoas que se encontram na mesma problemática que eu”.
O início
Hendrik estava em uma festa de família, realizada no sítio de um tio, em Valinhos (SP), quando resolveu entrar na piscina com os primos. Um deles tinha consigo uma câmara de ar de caminhão, e Hendrick pediu-lhe que a segurasse na borda da piscina.“Dei alguns passos para trás, pulei e passei por dentro dela, no lado mais fundo da piscina. Dentro da água, percebi que já estava muito próximo do fundo e com muita velocidade ainda, então meu reflexo foi proteger meu rosto com os cotovelos. Mas eles escorregaram e bati meu queixo com muita força”, conta.
Com o impacto da batida, imediatamente Hendrik perdeu os movimentos. “Na hora em que tentei me levantar, percebi que meu corpo não respondia aos meus comandos. Sabia que algo havia ocorrido, só não tinha a certeza do quê”.
Até que outras pessoas percebessem o que estava acontecendo, Hendrik permaneceu com o corpo virado para baixo, sem conseguir respirar. “Na inocência, meus primos pensaram que eu estava brincando e começaram a afundar minha cabeça ainda mais. Já quase sem ar nos pulmões, eu pensei que aquilo era o meu fim”. Foi quando uma tia percebeu algo de errado, puxando sua cabeça para fora da água e dando-lhe a chance de pedir por socorro.
Após ter atendimento recusado pelo SAMU, com a alegação de que estava muito longe, a família o levou para um pronto-socorro e de lá Hendrik foi transferido para o hospital da Unicamp, onde recebeu o diagnóstico: estava tetraplégico.
“O médico disse que meu quadro era irreversível, não voltaria a andar, não mexeria mais os braços, não respiraria mais sozinho, somente com ajuda de aparelhos. Só tinha uma coisa da qual ele não sabia: era eu quem estava ali, e faria o possível e o impossível para provar que ele estava errado”.
A luta pelo impossível
“É engraçado quando você não pode se mexer, porque sempre tem um lugar coçando e
você não consegue fazer nada, incrível. Mas sempre tinha alguém para fazer isso pra mim”. Esse é um dos comentários divertidos de Hendrik, que faz questão de afirmar que sempre esteve cercado por pessoas especiais, desde familiares, amigos a profissionais que conheceu por conta do seu tratamento.
Certo dia, foi justamente essa coceirinha incômoda que fez o jovem muito feliz. “Eu estava com os olhos fechados e começou aquela coceira no meu rosto. Sem perceber, eu levantei o braço direito e cocei. Abri os olhos e pensei: ‘como é bom sonhar’”. Mas o sonho era realidade.
“Pensa na alegria de um ser humano! Chamei o médico e disse: ‘Olha, voltei a mexer o braço. Você estava errado’. Ele respondeu: ‘É Hendrik, parabéns, você conseguiu mexer o braço mesmo, mas, infelizmente, a respiração não voltará. Seu diafragma foi muito afetado pela lesão’. Respondi no ato: ‘é isso que veremos’”. E esse seria seu próximo desafio.
Depois de muitos dias no hospital, o que Hendrik mais queria era ter contato com o mundo externo. “Queria ter o prazer em ver novamente o sol, sentir o ar quente de um dia de calor, ver o vento chacoalhar as folhas das árvores”. O pedido foi aceito e lá foi ele, sentado em uma grande poltrona e acompanhado de um cilindro de oxigênio.
“A claridade ofuscou minha vista, senti o ar quente dificultando de alguma forma a entrada de oxigênio vindo do cilindro para meus pulmões. Mas, confesso, não tinha nada nesse mundo que pagasse aquela sensação indescritível, de prazer e, de certa forma, de liberdade”.
De volta ao quarto, Hendrik não parava de pensar sobre como poderia reverter o seu quadro, sendo que a máquina era responsável por 80% do seu oxigênio. Seu próximo alvo foi a fisioterapeuta responsável. “Perguntei como eu faria para voltar a respirar e ela me respondeu que minha lesão era muito grave, mas que poderíamos tentar algo, sem garantias”.
A profissinal ensinou exercícios para fortalecimento do abdômen na hora da respiração e, menos de duas semanas depois, ele conseguia ser responsável, sozinho, por 80% da sua respiração.
E foi assim que pôde mudar de ala, partindo para a ortopedia. Ao completar 62 dias no hospital, finalmente recebeu alta e foi para casa. Era o início do tratamento de fisioterapia na Unip e PAI (Programa de Acessibilidade Inclusiva, em Campinas).
Em 2009, Hendrik foi incentivado por amigos médicos a praticar esporte e, mesmo duvidando de sua capacidade, ao conhecer uma pessoa que tinha quase as mesmas limitações que ele e jogava rugby em cadeira de rodas, entrou para o esporte paraolímpico, pelo qual já conquistou medalha de prata e troféu de melhor defensor do campeonato.
Avanços
“Recuperei muitos movimentos e funções das quais eu tinha perdido. Eu estava em estado vegetativo, só mexia os olhos, falava bem pouco e com muita dificuldade. Recuperei 50% da mobilidade dos meus dois braços e 90% da minha respiração”.Mesmo não podendo fazer as mesmas coisas que fazia quando podia andar, Hendrik acredita que faz outras ainda mais produtivas. “O ser humano tem uma capacidade inimaginável de se adaptar a qualquer limitação. Hoje, faço muito mais coisas do que antes e sou extremamente feliz, pelo simples fato de fazer pessoas ao meu redor felizes só por eu estar ali sorrindo e lutando pelos meus ideais, não desistindo de enfrentar nenhuma barreira imposta pela vida. Eu sempre ergo a cabeça, bato de frente com os obstáculos e consigo vencê-los”.
Questionado se acredita que um dia poderá voltar a andar, Hendrik é realista. “Nada é impossível, mas creio que, hoje, a tecnologia não está avançada o suficientemente para por um paraplégico ou um tetraplégico de pé, andando normalmente outra vez”, diz. “Mas creio que este tratamento ajude a melhorar os movimentos dos dedos das minhas mãos. Entretanto, se não der certo, não perderei nada, só terei benefícios com mais essa experiência”.
Para colaborar
Quem quiser coloborar com Hendrik, para que ela consiga realizar seu tratamento em Miami, seja financeiramente ou ajudando-no a encontrar uma moradia, pode entrar em contato pelo email: [email protected].
