“Brasileiro da SWAT” é acusado de farsa

Por Marisa Arruda Barbosa

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Se você não conhece Marcos do Val, “O Brasileiro na SWAT”, provavelmente algum amigo seu “curte” a página dele no Facebook. Com quase 4 milhões de seguidores, Do Val tornou-se autoridade nos últimos anos em relação a segurança pública e táticas de defesa e mostra constantemente a rotina de treinos da SWAT.

Só que ao contrário da impressão passada pelas imagens dele usando uniformes da SWAT, armado e ao lado de policiais americanos, o próprio Do Val afirma não ser nem policial nem membro da SWAT, mas um instrutor de técnicas de imobilizações táticas da SWAT através da companhia que fundou, CATI- International Police Training, desde 2000, e membro honorário da SWAT de Beaumont, no Texas – o que quer dizer ele recebeu o título sem precisar preencher os requisitos para o cargo. Ele também é mestre 2º Grau em Aikido, diplomado e credenciado pela International Aikido Federation, situada no Japão, e foi militar do exército brasileiro no 38o Batalhão de Infantaria, de acordo com descrição em seu site.

Seu site lista também que foi instrutor de instituições como US Army, Navy Seals, Vaticano, operações especiais da NASA (Marshall Space Flight Center), e que fora chamado com urgência após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 para treinar os soldados americanos que foram lutar na guerra do Afeganistão e Iraque.

Nos últimos meses, um grupo formado por brasileiros nos EUA e no Brasil ligado ao mundo tático, ao US Army, à polícia e mesmo residentes na Europa, resolveu desvendar a imagem passada por Do Val. Para o grupo, Do Val se aproveita de sua posição como instrutor na SWAT para se promover no Brasil com a venda de cursos e palestras.

O confronto tem se dado na maior parte das vezes online, via redes sociais, e em grupos do aplicativo WhatsApp, com trocas de acusações, compartilhamento de vídeos, denúncias de difamação e supostas ameaças.

Para eles, a imagem passada por Do Val é de que ele faz parte da polícia americana, algo que ele teria afirmado em situações no passado, uma delas registrada em vídeo.

O brasileiro e cidadão americano Lincoln Batista, de 29 anos, membro do US Army e que atualmente está servindo na infantaria do exército no Afeganistão, foi um dos que começou a “briga”. Para ele, o brasileiro está usando o nome da SWAT para se promover no Brasil. “A SWAT é uma instituição que conta com os melhores policiais que são os que dão o crédito à instituição. Mas, uma pessoa que foi contratada para dar aula de imobilização sair falando que é membro da SWAT, tirar fotos mostrando ‘police’ no uniforme e sem passar uma imagem clara do que realmente ele faz para a população é uma vergonha”, disse Batista. “Ele é instrutor de imobilização, mas não um membro da SWAT. Por isso, ele não utiliza arma de fogo, sendo que o trabalho dele não é policial. Mas a propaganda se passando por um policial está explícita. Não é culpa dele que o pessoal entende errado, mas ele passa essa imagem segurando armas como se fosse ferramenta de trabalho dele, mas não é”.

Outro que entrou na briga é Maurício Lima, que vive em Colorado Springs, no Colorado, e é aposentado do US Army, onde serviu por 7 anos e oito meses, incluindo o Iraque e Afeganistão.

Segundo Maurício, Do Val ‘vende’ algo muito superior do que o que ele realmente faz. “De dar exibições aqui na SWAT ele já admitiu que é policial, que é membro da SWAT, postou que foi chamado às pressas depois de 11 de setembro para treinar as Forças Especiais americanas que estavam indo em combate para o Iraque e Afeganistão. Temos os prints de tudo isso que ele postou, pois ele já apagou muita coisa depois que a gente denunciou”, relata. “Eu entrei nessa luta com várias pessoas que são respeitadíssimas do mundo tático aqui e no Brasil e que sabem muito”.

Marcos do Val se defende

Ao ver a onda de críticas tomando força, Do Val publicou um vídeo no dia 24 de fevereiro em sua página do Facebook (veja no fim dessa reportagem).

Para ele, essa perseguição começou depois que ele anunciou parceria com a empresa Taurus em um projeto de valorização dos policiais brasileiros, chamado Heróis Reais. “Como a Taurus teve muitos problemas no passado de qualidade de suas armas, gerou muita repulsa por alguns profissionais da área, e por isso partiram para cima de mim com toda essa raiva e campanha de difamação. Tenho tomado providências junto à Delegacia de Crimes Virtuais para que os mesmos respondam pelos crimes de injúria, difamação e calúnia”, explica.

No vídeo, Do Val afirma que não é policial, mas sim instrutor de policiais. “Que me lembre, ao longo desses 17 anos falei duas vezes a frase ‘como sou policial’. Uma vez foi em um vídeo, outra em uma resposta a um seguidor no meu Facebook. Essa frase jamais foi dita com o intuito de tirar qualquer vantagem pessoal”.

Do Val afirmou ainda não ter nenhum vínculo empregatício com a cidade de Dallas, com a Polícia de Dallas, com a SWAT de Dallas, nem com nenhum outro departamento de polícia.

“Eu dei e dou treinamentos de imobilizações táticas para essa unidade e tantas outras unidades da SWAT através da TTPOA e do CATI Treinamento Policial”, disse. “Essa técnica de imobilizações táticas eu desenvolvi na década de 90, no estado do Espírito Santo, e foi ela que abriu tantas portas no mundo inteiro para mim”.

Ao Gazeta, Do Val explicou que embora seja instrutor de imobilização, por causa da relação de confiança com a SWAT de Beaumont, tem a permissão de participar de operações sempre que possível.

“Para a SWAT nos EUA eu sou instrutor somente na disciplina ‘Imobilizações Táticas’, mas me especializei em todas as táticas e técnicas da SWAT. Assim, posso ministrar minhas aulas o mais próximo ainda da realidade da SWAT e usamos na aula armas e equipamentos operacionais”.

“Um brasileiro na SWAT”?

O GAZETA questionou Do Val se o título do livro sobre ele “Um Brasileiro na SWAT” não confunde seus leitores em relação a ele ser ou não policial.

“Criar confusão sobre a natureza do meu trabalho nunca foi meu objetivo. O livro sobre mim conta a minha experiência, os desafios e as vitórias. E esta trajetória narra como vim a ser instrutor na TTPOA (Texas Tactical Police Officers Association), ministrar meu curso de imobilizações táticas para várias equipes táticas policiais (SWAT), mas em momento algum há ali qualquer registro como se eu fosse membro da SWAT de outra forma que não a condição que já expus, como membro honorário da equipe da SWAT de Beaumont”, explica. “Foi justamente na condição de instrutor que sempre me posicionei e sempre mencionei a todos que nunca figurei na qualidade de servidor policial”.

O Gazeta também questionou Do Val em relação a uma matéria publicada no G1 (em 20/10/2007), intitulada “'Tropa de elite' americana desembarca no Brasil”, que tinha uma referência a Do Val como “membro e instrutor da Swat”, que falou “de seu escritório em Dallas”.

Do Val explicou que, na época, tinha um escritório em Dallas, este independente do Dallas Police Department.

“Quanto aos episódios isolados em que ‘fui policial’ foi algo mencionado, (acho que em duas situações) durante os 17 anos da minha carreira, era minha intenção me referir à posição honorária, não como um servidor público policial. Jamais fiz tais ou quaisquer afirmações com propósito de exercer autoridade, auferir ou angariar vantagem, seja ela de qualquer natureza (moral, patrimonial, etc.). Ou seja, talvez a única impropriedade minha tenha sido em raríssimos lapsos em situações ao vivo suprimir apenas em tais momentos a condição de instrutor/membro honorário quanto à minha posição em relação a polícia”, declarou.

“Oportuno ainda ressaltar aqui a diferenciação evidente entre ‘instrutor policial’ e ‘policial instrutor’. No primeiro caso, trata-se de alguém que realiza instruções a um determinado órgão policial, que é o meu caso, pois eu instruo policiais, ora então, sou um instrutor policial, um instrutor de policiais. No segundo, a situação já seria daquele servidor policial que realiza instruções, expressão esta que jamais utilizei”, explica.

Evidências

O Beaumont Police Department confirmou ao GAZETA a sua relação com Do Val como instrutor. “Marcos do Val não é membro do Beaumont SWAT Team. Marcos conduziu treinamentos na área de táticas de defesa especificamente através do CATI e participou de alguns de nossos treinamentos também. Marcos continua a nos ajudar nessa área e somos agradecidos por seu contínuo esforço em nos ajudar”, escreveu, via e-mail, Sargento J.C. Guedry, Police Community Relations Supervisor/SWAT.

Já o Dallas Police Department (DPD), onde Do Val instruiu recentemente (de acordo com várias evidências mostradas por ele), respondeu ao GAZETA que Do Val não é e nem nunca foi membro nem do DPD, nem do DPD SWAT. “Ele instruiu um curso há alguns anos para o DPD. O DPD não usa seus serviços atualmente e não tem nenhuma ligação com ele”, disse Melinda Gutierrez, do Media Department.

Indagado, Do Val explica que sua relação com o Dallas SWAT é via cursos do TTPOA, dos quais participa desde 2001, e não diretamente com o departamento de polícia.

Este ano Do Val estará novamente como instrutor da conferência da TTPOA, uma convenção com palestras onde são mostradas técnicas policiais como de imobilização, atendimento pré-hospitalar e tático. O CATI vende pacotes para levar policiais brasileiros à conferência. O pacote do “Super SWAT”, que vai de 16 de abril a 5 de maio em Dallas, custa $2 mil dólares.

No entanto, Paulo Semajoto, dono de uma empresa de Ccnsultoria de segurança em São Paulo, insiste que Do Val sempre deixou claro que dava instrução ao Dallas Police Department e à SWAT e só agora nas últimas semanas está esclarecendo que é via TTPOA. “Ele vende pacotes para brasileiros dizendo ‘venha comigo para a SWAT’, mas na verdade ele não leva esses brasileiros para a instituição SWAT”, explica Semajoto. “Agora que ele está sendo desmascarado está deixando claro que é via TTPOA, e não na polícia de Dallas”.